XXI FANTASPOA | Fraquezas, de Ryan Oksenberg (Foibles, 2025)
- Henrique Debski
- há 16 minutos
- 4 min de leitura
Fraquezas propõe uma reflexão ao espectador sobre procurar por nossos próprios defeitos e tentarmos evoluir, a partir de uma comédia protagonizada por um casal bomba-relógio.

Curiosamente, em um mesmo dia no Fantaspoa, assisti a três filmes que, embora completamente diferentes, tratavam, cada um a sua forma, de um mesmo tema: reconciliações. Um terror cósmico, uma comédia absurda e um terror de possessão (Jimmy e Stiggs, Fraquezas e Sun), cada um deles abordava suas reconciliações entre pessoas em contextos diferentes, mas mantendo, como denominador comum, o amor que se mantinha umas pelas outras, apesar das desavenças. E por incrível que pareça, cada um dos filmes também encontrava soluções diferentes para suas problemáticas.
Em Fraquezas, Jordan, que recém-terminara o relacionamento, recebe uma visita de sua ex-namorada, Gabrielle, que lhe pede dez mil dólares, depois de dirigir embriagada e receber uma altíssima multa, a qual, se não for paga, pode leva-la à prisão. Então, ainda sem terem absorvido o término da relação, e ele com sua síndrome de herói, faz a ela uma proposta para vencer o alcoolismo e pegar o dinheiro: beber até ficar sóbria.
Apesar de parecer uma ideia absurda – e de fato ser –, o roteiro de Ryan Oksenberg é particularmente sagaz em usar desse humor tão ácido quanto perspicaz para construir esse casal, muito bem vivido por John Karna e Carina Conti, que entram de cabeça em seus personagens. A partir da situação do presente, o filme não precisa se debruçar sobre o passado ou sequer contar o que se passou nos cinco anos anteriores, quando é plenamente possível compreender as razões pelas quais o relacionamento terminou apenas observando as maneiras como os personagens se comportam.
Durante seus oitenta e cinco minutos de duração, somos imersos na intimidade de anos de problemas inacabados entre os protagonistas, e que provavelmente pouco foram discutidos antes da separação, que agora vem a tona como uma viagem alucinante ao cerne do apodrecimento dessa vida em conjunto, que reflete diretamente os maiores defeitos da personalidades de cada um: Jordan, e sua síndrome de herói, sempre tentando resolver os problemas do mundo, algo do qual ele (ou qualquer pessoa) é incapaz de fazer; e Gabrielle, com seu insistente hábito de deixar os problemas de lado, esperando que se resolvam sozinhos, até que se tornem uma grande bola de neve que sempre a atropela, como é o caso do alcoolismo.
Através desse choque de personalidades, Jornan e Gabrielle são, juntos, uma versão potencializada da autodestruição inerente a eles mesmos. O que começa apenas como uma comédia romântica sobre conciliação, por conta dessas características do casal, cada vez mais toma rumos obscuros, e emocionalmente violentos, muito bem trabalhados, com cautela e humor, pela direção de Oksenberg, em sua decupagem gradativamente acelerada e intensa, e perpassando pela violência doméstica, automutilação, manipulação e, especialmente, pela dependência emocional, tudo de ambos os lados.
É uma questão de tempo, então, para percebermos ser aquele apenas mais um dia comum nas vidas dos personagens, no qual um arrasta o outro para o fundo de um poço cada vez mais difícil de retornar, como pessoas que, por bem ou por mal, se merecem.
E por mais absurdo e surreal que possa parecer toda essa ideia, o filme atinge seus objetivos provocativos justamente pelo fundo de verossimilhança. O retrato talvez possa exagerar nas situações em que submetem um ao outro, repletas de humilhações, mas a violência das ações retratadas, quase sempre sem que os personagens se deem conta, é bastante realista enquanto típica de seres humanos, que, quando incompatíveis, se tornam uma bomba-relógio para a vida conjunta.
A ausência de um final feliz é justamente o que reforça esse ponto da verossimilhança, quando, no ato final, um elemento fantástico faz com que os personagens, em suas infinitas e redundantes brigas, percebam suas fraquezas. Mas, por outro lado, diante de tamanho orgulho, é improvável que aprendam de verdade, e é mais provável que retomem, novamente, a toda essa violência cíclica de um relacionamento tóxico, e provavelmente um com o outro.
Assim, fica claro em Fraquezas uma compreensão madura de Ryan Oksenberg em relação ao ser humano, repleto de fraquezas naturais. Mas para que possamos evoluir enquanto pessoas, precisamos reconhece-las, apreender a superá-las, e tentar ser diferente. É um processo difícil, e sua eliminação é impossível, mas é sobre tentarmos encarar nossos problemas pessoais de frente, e não jogar para o lado, ou nas costas alheias, ou, ainda, tentar resolver os dos outros sem que consigamos resolver os nossos próprios, em gestos de pseudo-altruísmo.
É curiosa a quantidade de reflexões que um filme como Fraquezas pode oferecer, tanto para o espectador, ao sentir e refletir da própria culpa por eventos da vida, e pensar nas próprias fraquezas (naturais) enquanto pessoa; tanto quanto para o próprio realizador, quando Oksenberg, antes do início da sessão, descreveu seu filme como uma forma de arteterapia para si próprio, algo bem na esteira do que Woody Allen faz desde a década de 1970, ou mais recentemente, Jesse Eisenberg fez com Quando Você Terminar de Salvar o Mundo (2022) e A Verdadeira Dor (2024), ainda que de maneiras distintas, parte da originalidade de cada cineasta, e aqui se utilizando muito bem de um humor absurdo, e certeiro, ao estilo Mel Brooks – e repleto de boas piadas e referências judaicas, que, meros detalhes, a mim foram motivo de ainda mais aproximação ao filme, e creio que também ao diretor.
Avaliação: 4.5/5
Fraquezas (Foibles, 2025)
Direção: Ryan Oksenberg
Roteiro: Ryan Oksenberg
Gênero: Comédia, Drama, Fantasia
Origem: EUA
Duração: 85 minutos (1h25)
XXI Fantaspoa (Mostra Low Budget, Great Films)
Sinopse: Um codependente emocional com complexo de herói tira a ex-namorada da cadeia após uma acusação de dirigir embriagada e tenta "salvá-la" do alcoolismo forçando-a a beber até ficar sóbria. (Fonte: Fantaspoa)
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