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XXI FANTASPOA | Rich Flu, de Galder Gaztelu-Urrutia (Idem, 2025)

  • Foto do escritor: Henrique Debski
    Henrique Debski
  • 7 de mai.
  • 4 min de leitura

Rich Flu parte de uma ideia muito engraçada em direção a um thriller insosso, que, ao se levar a sério demais, perde o substrato da sátira pretendida.


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Idealizado pelos mesmos responsáveis por O Poço (2020), uma das grandes febres da Netflix durante o período da pandemia, que caiu como uma luva para o contexto de isolamento em que vivíamos, Rich Flu é um projeto cuja ideia básica é definitivamente (ainda) mais arriscada.

 

Em uma interessante conversa após a sessão, durante o Fantaspoa, um dos roteiristas, Pedro Rivero, presente desde o início do processo de escrita, relatou, curiosamente, as dificuldades da produção. Antes de mais nada, o argumento, idealizado desde antes da pandemia, teve de ser deixado temporariamente de lado para trabalhar, com urgência, em uma sequência para O Poço, já lançada; mas, especialmente, o principal problema foi conseguir investimento. Claro, em um filme que ironiza os milionários e bilionários, era de se esperar que grandes empresas tivessem o interesse de não financiar uma obra que deles tirasse sarro, e nem mesmo streamings como a Netflix, com quem a equipe já trabalhava, ou mesmo a Prime Video demonstraram interesse no projeto.

 

Então, a partir de fontes independentes, e com auxílio do governo espanhol, Rich Flu saiu do papel com um orçamento aproximado de dez a quinze milhões de euros, um valor bem aproveitado para uma produção complexa, que se movimenta por diversos lugares do mundo, de Londres a Barcelona, se direcionando até mesmo ao próprio território do continente Africano.

 

E, honestamente, a ideia de uma doença que atinge pessoas em razão de seus acúmulos financeiros é muito promissora quando bem trabalhada, e uma certa inspiração no trabalho de Ruben Östlund é inegável, sobretudo por algumas passagens absurdas que os roteiristas fazem questão de inserir. O próprio tom jocoso à burguesia assumido pela obra, ao trabalhar como sintoma da gripe o esbranquiçar dos dentes, que se tornam luminosos e visíveis à distância, é uma forma cômica de trabalhar o caos daquele universo sob um tom satírico à sociedade.

 

Mas, por outro lado, se essas ideias potencialmente engraçadas se fazem muito presentes no roteiro de Rich Flu, por outro lado é evidente que o filme não sabe muito bem o que fazer com elas, quando se leva a sério demais, especialmente durante a segunda metade, quando justamente o humor ácido seria uma solução interessante para escapar de uma obviedade, e punir uma protagonista que, ao longo das quase duas horas de duração do longa, claramente não aprende nada com tudo o que acontece ao seu entorno.

 

Muito disso, na verdade, se deve também à direção de Galder Gaztelu-Urrutia, que acostumado a narrativas mais tensas e centradas em espaços claustrofóbicos como as de O Poço, se perde na maneira de trabalhar com a loucura e intensidade de Rich Flu, e sobretudo dentre o tom cômico que poderia muito bem ter assumido desde o princípio. Sua escolha por uma câmera na mão o tempo todo pode até passar uma sensação de urgência e desespero, que se adequa a proposta, mas acaba por perder a oportunidade de se debruçar sobre o debate ao nunca desacelerar desse ritmo frenético em momentos específicos.

 

A cena do avião, por exemplo, pela metade da projeção, poderia ter muito se beneficiado de uma fotografia estática, com o foco em um ponto específico, para filmar justamente as reações das pessoas em cena e não só na confusão, mal decupada pelo excesso de cortes para todos os lados que torna incompreensível toda a sua dinâmica. E essa montagem, infelizmente atrapalhada, é algo que vale para todos os momentos de ação, e se estende até para momentos chave, onde um simples diálogo rende cortes entre diversos ângulos e reações de maneiras tão repentinas que retiram o impacto do que está sendo dito.

 

E assim, Rich Flu, apesar de todas as dificuldades que enfrentou ao longo da produção, entre as mudanças completas no elenco e o desinteresse das grandes empresas em oferecer investimento, perde oportunidades de ir além em sua evidente crítica social que grita na tela, ao se levar muito a sério, e preferir seguir o caminho de um thriller do que efetivamente de uma comédia, ainda que pudesse ser tensa. Basicamente, não faz nada que Triângulo da Tristeza, de Ostlund, já não tenha feito de maneira mais refinada e menos óbvia há cerca de três anos, sobretudo ao quase reproduzir seu desfecho em um longo epílogo, e sobretudo um pessimismo em relação à sociedade a ao próprio ser humano. Era uma sátira com muito potencial, que acaba deixando tudo pelo caminho.

 

Avaliação: 2/5

 

Rich Flu (Idem, 2025)

Direção: Galder Gaztelu-Urrutia

Roteiro: Pedro Rivero, Galder Gaztelu-Urrutia, David Desola e Sam Steiner

Gênero: Thriller, Ficção-Científica, Comédia

Origem: Espanha, Chile, EUA

Duração: 116 minutos (1h56)

XXI Fantaspoa (Mostra Internacional)

 

Sinopse: Um vírus mortal começa a infectar a elite mais rica da sociedade, eliminando milionários em seu caminho. Gradualmente, seu foco se expande para incluir fortunas mais modestas, forçando todos a se livrarem de seus bens. O problema é que não há mais ninguém para comprá-los. (Fonte: Fantaspoa)

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