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CRÍTICA | A Hora do Mal, de Zach Cregger (Weapons, 2025)

  • Foto do escritor: Henrique Debski
    Henrique Debski
  • 11 de ago.
  • 4 min de leitura

A Hora do Mal expande a fórmula de Zach Cregger, em uma comédia de erros voltada para o terror que se reinventa constantemente a partir de uma investigação imersiva.


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O cinema autoral de Zach Cregger, ainda que bastante recente, já estabeleceu seus contornos há alguns anos com o excelente terror Noites Brutais, o qual constantemente desconstruía as premissas básicas de seus mistérios em uma narrativa segmentada, que intercalava, sob diferentes arcos, passagens de diferentes pessoas em uma mesma casa “assombrada”, que aos poucos se encaixavam como um grande quebra-cabeças esclarecedor, e se reuniam para chegar a um final absurdo, subvertendo as expectativas com muita diversão.

 

Dado o sucesso do método, Cregger faz de A Hora do Mal uma expansão, e aperfeiçoamento, da fórmula criada anteriormente. Novamente tendo como base uma premissa clássica do terror – dessa vez, o desaparecimento de crianças em uma pequena e pacata cidade norte-americana -, o cineasta multiplica o mistério por dezessete (afinal, são dezessete as crianças que somem numa mesma noite), e desde o primeiro instante, já desconstrói uma ideia: antes de pensar em “quem”, as perguntas antecedentes são “o que”, “como”, “por que” e “para que”. Isso pois as crianças não foram exatamente raptadas, mas simplesmente saíram correndo de suas casas, no meio da noite, com os braços abertos, em linha reta, e rumo a escuridão, e não mais foram vistas.

 

Em meio ao alarde e desespero da cidade, há um ponto de partida claro. Alguma coisa tem em relação ao mistério o fato de todas as crianças desaparecidas estudarem na mesma sala, além de terem aula com uma mesma professora; e, apenas uma única criança não desapareceu.

 

Sob um contorno bastante crítico, a narrativa nos direciona o olhar de uma multidão revoltada em cima da professora, vivida por Julia Garner, em uma intenção de provocar o linchamento da única pessoa que, creem, ser capaz de influenciar e desaparecer com dezessete crianças em uma única noite. A corda sempre arrebenta para o lado mais fraco. Uma mulher solitária contra uma multidão de pais enfurecidos.

 

Ao mesmo tempo que acompanhamos seu ponto de vista, um pai em depressão, vivido por Josh Brolin, buscando pelo filho desaparecido parece ser o que se precisava para encarar o mistério de frente. Diante de uma polícia ineficaz, incapaz de buscar pistas nas câmeras das casas ou de pensar fora da caixa, e aparentemente sem muita pressa em revolver o caso, o instinto paterno leva o personagem a progredir em uma investigação própria, mesmo em meio a uma comunidade de pais que não pretendem colaborar.

 

E assim por diante, acompanhamos outros pontos de vista, sempre seguindo uma espécie de linha reta, em uma verdadeira comédia de erros (ao estilo Fargo, dos Irmãos Coen), porém voltada ao terror. O olhar de um nos fornece uma informação importante, e nos leva até certo ponto; para, em seguida, se conectar de alguma forma com o olhar do outro – muitas vezes desenvolvendo seus personagens por meio das atitudes tomadas, e dos efeitos dessas –, e pouco a pouco nos oferecendo uma visão geral do que está acontecendo. Não são exatamente linhas paralelas (as vezes uma acaba antes, e outra se encerra depois), mas, de toda maneira, e brilhantemente, tudo acaba se conectando de tal forma que, mesmo já tendo condições de compreender o que se passa de verdade, a atmosfera de imprevisibilidade sempre se mantém no ar para nos surpreender, da primeira à última cena.

 

Não apenas o quebra-cabeças funciona muito bem pela maneira como a narrativa é arquitetada, mas especialmente pela forma como Cregger faz questão de envolver o espectador em meio ao mistério. As informações, ainda que posteriormente explicadas pelo filme, deixam espaço para a formulação de teorias pelo público, entre as sequências de sonhos – e sustos – dos personagens, até o próprio aspecto que favorece um ar de conspiração.

 

Da mesma forma que o terror se encontra escondido nas entrelinhas daquela cidade em uma mistura de luto, desespero e medo por parte da população frente aos eventos estranhos, muito bem estabelecidos pela direção a partir de uma câmera capaz de filmar o desespero de pessoas sem saber o que fazer, confiando em autoridades ineficientes, descontando a raiva e formulando acusações sem provas, em meio a aparições estranhas de elementos em determinadas oportunidades sempre ao fundo, quase imperceptíveis (uma materialização do “agente do caos”); Cregger pouco a pouco vai assumindo, também, um ar de comédia. É uma sensação estranha, de uma risada provocada pelo desconforto, uma espécie de provocação, relevadora, afinal, de uma sátira social, que abraça conspirações através da violência, e ao mesmo tempo cutuca a incapacidade do Estado e de seus dirigentes em cumprir seu papel.

 

Ainda que o filme eventualmente se apresse para entregar a solução do mistério – eu não me incomodaria nem um pouco em passar mais vinte, trinta minutos a mais imerso naquela investigação –, A Hora do Mal encontra brilhantismo ao se inspirar e retrabalhar com originalidade as típicas comédias de erros dos Irmãos Coen (os diretores que melhores trabalham com), sob um ritmo constante, em uma teia de personagens e acontecimentos orgânica e, sobretudo, surpreendente, com uma montagem que sabe preservar as respostas e momentos certos para a hora certa, sempre mudando os caminhos da história contada e evitando ao máximo a obviedade, culminando em um final emblemático – talvez até uma das melhores cenas do ano até então. Zack Cregger prova que Noites Brutais foi apenas o início de uma ótima filmografia de terror, e o prelúdio para aprimorar um cinema que não subestima seus personagens e, especialmente, respeita o espectador, trazendo-o para dentro da obra e o tornando parte da investigação.

 

Avaliação: 4/5

 

A Hora do Mal (Weapons, 2025)

Direção: Zach Cregger

Roteiro: Zach Cregger

Gênero: Terror, Thriller

Origem: EUA

Duração: 128 minutos (2h08)

Disponível: Cinemas

 

Sinopse: Quando todas as crianças, exceto uma, de uma mesma classe escolar somem misteriosamente na mesma noite e exatamente ao mesmo tempo, todos da cidade começam a se questionar quem ou o que está por trás deste estranho desaparecimento.

 
 
 

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