CRÍTICA | A Vida de Chuck, de Mike Flanagan (The Life of Chuck, 2025)
- Henrique Debski
- há 19 horas
- 3 min de leitura
Em A Vida de Chuck, Mike Flanagan explora a vastidão humana, em uma adaptação de Stephen King que evita o terror, mas ainda abraça, com orgulho, a fantasia.

De alguns anos para cá, especialmente depois da pandemia, decidi que não assistiria mais a trailers, e me esforçaria a entrar em qualquer filme sabendo o mínimo possível, ou mesmo nada, a seu respeito. Claro que isso nem sempre é possível, afinal, vez ou outra esbarramos em algum spoiler acidental, ou alguém comentando sobre o filme, ainda que vagamente, ou até nos deparamos com alguma peça publicitária, mas a regra é, se saber, apenas o mínimo.
Tendo em vista que os filmes, no geral, são pensados por seus realizadores justamente para que não saibamos nada antes de entrar na sessão, algumas experiências podem ser prejudicadas. A Vida de Chuck, nesse sentido, se beneficia, e muito, da completa escuridão do espectador em relação à sua proposta, em uma narrativa articulada em três atos completamente distintos, que aos poucos se encaixam como um grande quebra-cabeças metafórico.
Já dizia Raul Seixas, em sua canção Meu Amigo Pedro, “cada um de nós é um universo”. Entre um thriller sobre o fim do mundo, um dia comum na vida de um homem, e um drama familiar, A Vida de Chuck articula, quase em como três segmentos distintos e muito bem delimitados, três ideias diferentes, as quais vinculam, de alguma maneira, a pessoa de Chuck Krantz, um simples contador que vive a própria vida como qualquer outra pessoa.
Na medida em que assistimos a essas histórias, compreendemos as conexões que as narrativas estabelecem entre si, e verificamos como um denominador comum o “viver a vida”. Enquanto nosso tempo de vida é tão incerto quanto limitado, Mike Flanagan, adaptando o conto homônimo escrito por Stephen King, reflete, a todo tempo, sobre o valor que damos para cada um dos momentos que temos. Não são apenas as grandes conquistas ou realizações que nos marcam, mas também os pequenos gestos do dia a dia, e o sentimento de saudades pelos tempos bons e memórias felizes, que nos guiam pelos demais momentos de nossas vidas.
Flanagan, em seu primeiro longa que escapa ao cinema de terror, não abandona, e muito menos se esquece, dos elementos do gênero que o consagrou. Abraçando a fantasia, tal como sua base, aborda, em um primeiro momento, o mistério desenvolvido ancorado em um estranhamento, dos personagens, do universo, e especialmente do espectador.
Uma vez que estabelecidos elementos misteriosos em tela, e um constante sentimento de caos, de um mundo pouco a pouco deixando de funcionar, e se desligando lentamente – o que se reflete diretamente em todo o entorno do personagem de Chiwetel Ejiofor, tão preocupado quanto intrigado com a situação que vive –, o diretor parte, em seguida, para dois segmentos muito mais voltados ao drama. Em um primeiro momento, uma grande cena de dança protagonizada por Tom Hiddleston parece mais com algo perdido em meio ao filme, mas na medida em que somos expostos a proposta geral, os pequenos momentos e elementos destacados pela narrativa de A Vida de Chuck tomam proporções muito maiores do que o esperado.
Talvez alguns se incomodem com a proposta exageradamente manipulativa do longa, o que faz parte, ou talvez por seu estilo piegas, mas há todo um cuidado por parte de Flanagan para não tornar seu projeto uma grande metáfora pedante que precisa se explicar constantemente ao espectador por meios verbais. Seu sutil desenrolar, escondido nas entrelinhas e nos detalhes da composição da mise-en-scène transforma uma virada dramática que poderia soar muito mais cafona na conclusão de um grande círculo, ligado, perfeitamente, de ponta a ponta. A Vida de Chuck espera que estejamos abertos ao que irá propor, e nos convida a olhar para dentro de nós, para nossas próprias vidas, e refletir sobre como temos vivido, sem enxergar o amanhã.
Avaliação: 5/5
Direção: Mike Flanagan
Roteiro: Mike Flanagan, adaptado de Stephen King (conto)
Gênero: Drama, Fantasia
Origem: EUA
Duração: 111 minutos (1h51)
Disponível: Cinemas
Sinopse: Da infância à idade adulta, Charles "Chuck" Krantz vivencia a maravilha do amor, a tristeza da perda e as multidões contidas em todos nós.
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