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CRÍTICA | Casa de Dinamite, de Kathryn Bigelow (A House of Dynamite, 2025)

  • Foto do escritor: Henrique Debski
    Henrique Debski
  • há 6 dias
  • 4 min de leitura

No retorno de Bigelow ao cinema de guerra, os Estados Unidos perdem a invulnerabilidade, em uma provocação sobre a eficácia da segurança nacional e os protocolos para caso sejam atacados.


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Até certo ponto, existe uma natural tolerância dos norte-americanos em aceitar críticas à cultura do próprio país, principalmente quando advinda de cineastas locais. No entanto, ao questionar sua hegemonia global, e levantar questões quanto à segurança nacional, sem demonstrar heroísmo e poder, mas sim vulnerabilidade, a recepção de um filme pode ser completamente distinta. Esse orgulho em acreditar piamente no Estado, na impenetrabilidade, e na descrença de que erros podem ser cometidos, especialmente quando se trata do possível início de uma guerra mundial, tanto deixa o povo alarmado e especialmente incomodado que a recepção de Casa de Dinamite no país não foi das melhores.

 

Adotando uma estrutura “hashomoniana” (de pontos de vista), o retorno de Kathryn Bigelow aos longas-metragem, e ao seu singular cinema de guerra, provoca o espectador norte-americano ao explorar um cenário impensável à maioria da população, na qual os Estados Unidos não estão no comando de uma operação, mas sim figuram como alvos de uma ameaça desconhecida – em proporções e autoria. Em cerca de trinta minutos, acompanhamos grupos de pessoas envolvidas na detecção e impedimento de uma catástrofe de proporções nucleares, por todos os lados do país, em salas de comando diversas, conectados à internet e trabalhando na busca por uma solução.

 

Em três segmentos, repassamos pelo mesmo tempo sob os olhares de diferentes pessoas, cargos e funções dentro do Estado, desesperadas na busca pela solução, conversando entre si e procurando respostas e soluções por todos os lugares possíveis. De certa maneira, pode parecer cansativo ouvir os mesmos diálogos por praticamente três oportunidades, mas tudo funciona na base de um enorme quebra-cabeças no qual as peças são entregues aos poucos, e se constrói de maneira a compreender os diferentes papeis de cada cargo e instituição durante a gestão de uma crise como a retratada.

 

Ainda que um cenário puramente fictício, Bigelow questiona a todo tempo a verdadeira preparação dos Estados Unidos para lidar com uma emergência por eles considerada como algo tão distante da realidade – afinal, quem ousaria, ao olhar deles, atacar a nação mais poderosa do mundo? No excesso de protocolos, a direção se aproveita do caos para trabalhar sua ineficiência, a impossibilidade de se prever um excesso de variáveis, e a falta de qualquer treinamento para uma situação demasiadamente extrema.

 

Todo o desespero se agrava frente às inúmeras vidas em jogo – milhões, de todos os lados, para estimar um mínimo –, e filmando cada ambiente, personagem e sala de comando com uma câmera trêmula, em constante movimento e se aproximando das pessoas em cena, a diretora nos torna testemunhas inquietas documentando o passo a passo do despreparo, do medo e do desespero em lidar com uma verdadeira calamidade, e não mera simulação como estão todos sempre acostumados.

 

Essa sensação de estarmos junto dos personagens naquele ambiente de desespero é potencializada pelo trabalho de montagem assinado por Kirk Baxter, que aproveita da inquietude da direção de Bigelow, e da fotografia de Barry Ackroyd, para entrecortar os personagens em diálogos acelerados, e informações advindas dos mais diversos lugares, ao ponto de tornar-se a ameaça não apenas cada vez mais real, em razão do tempo, mas também distante de ser contida, tendo em vista os esforços, em vão, para conter o míssil a caminho de uma das principais regiões metropolitanas do país.

 

Quanto mais dados recebem dos desafios que se encontram à frente, seja na impossibilidade de conter o ataque ou na decisão de como e contra quem orquestrar um contra-ataque, o filme explora, também, o medo no rosto de cada um dos funcionários do Estado, enquanto percebem o fim imediato do mundo em que vivem. Se há um desespero enquanto trabalham sem enxergar a luz do dia, em ambientes claustrofóbicos, por outro lado o coração aperta na medida em que param para pensar e se lembrar dos rostos de suas famílias, as quais não poderão salvar.

 

O desfecho, que para alguns pode soar decepcionante, é na verdade o maior ponto de reflexão oferecido por Casa de Dinamite, enquanto o anticlímax oferecido vem na forma de uma pergunta que não precisa ser respondida, seja pela diretora, ou pelo próprio roteiro de Noah Oppenheim – afinal, independentemente do que aconteceria, o final seria, de todo modo, determinado. E essa provocação é o que, no fundo, deixa a população norte-americana incomodada, ao derrubar a máscara e revelar uma enorme vulnerabilidade da própria nação. Se é ou não é verdade, a dúvida fica no ar, mas fica uma pulga atrás da orelha: até onde um país é invulnerável e seus limites e fronteiras, impenetráveis?

 

Avaliação: 4/5

 

Casa de Dinamite (A House of Dynamite, 2025)

Direção: Kathryn Bigelow

Roteiro: Noah Oppenheim

Gênero: Thriller, Drama

Origem: EUA

Duração: 112 minutos (1h52)

Disponível: Netflix

 

Sinopse: Atingidos por um míssil não identificado, os Estados Unidos precisam correr para descobrir quem foi e determinar os responsáveis para garantir um ataque eficaz e ao mesmo nível.

 
 
 

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