16º CINEFANTASY | COMPILADO: CURTAS – “Bergamota”, “Wakashu”, “Umbilina e Sua Grande Rival”, “Baby Blues”, “Ataques Psicotrônicos”, “Se Eu Tô Aqui É Por Mistério”, "Sem Fantasia" e outros
- Henrique Debski

- 24 de set.
- 6 min de leitura
Nesta publicação, o objetivo é trazer algumas críticas em formato reduzido sobre os curtas que assisti durante minha cobertura do 16º Festival Cinefantasy!

Bergamota (Idem, 2023)
Direção: Hsu Chien
Origem: Brasil
Avaliação: 3/5
Pelas mãos de Hsu Chien, cineasta com vasta experiência na comédia, Bergamota é uma incursão interessante no cinema de gênero, em um tom manipulativo que brinca com seu espectador a partir de constantes viradas narrativas em apenas 15 minutos, na base de que “nada é o que parece ser”.
De certa maneira, a escolha pelo preto e branco reforça esse tom de incerteza pretendido, mas existe um excesso que aos poucos atrapalha a obra. Enquanto sob um aspecto erótico, os enquadramentos aproximados, sempre em primeiro ou primeiríssimo plano, ilustram a contento o tesão dos personagens em cena, abraçando com eficácia a tensão sexual, mas quando o jogo vira e o curta parte para o terror, a manutenção dos closes e planos excessivamente aproximados perdem um pouco da razão, e nos impede de compreender e mesmo de enxergar a violência e a ação que se desenrola em cena.
A tensão, de certa forma, se esvai, e na medida em que pouco vemos, a atmosfera se rompe, com um desfecho interessante no papel, mas que, na imagem, acaba não funcionando tão bem. Ainda assim, um interessante primeiro curta no cinema de terror, de um diretor com evidente paixão pelo gênero, mas com talvez mais boas ideias do que de fato execução.

Wakashu (Idem, 2025)
Direção: Lady Jill
Origem: Brasil
Avaliação: 4/5
A falta de uma narrativa propriamente não impede que Wakashu mostre suas virtudes enquanto uma homenagem sincera ao cinema asiático de artes marciais, mas agora, no Brasil, sob o olhar de uma pessoa trans, reaproveitando de conceitos e os desconstruindo com cuidado e inventividade. Jill Gillespie (ou Lady Jill, como assina) prova versatilidade enquanto diretora na coreografia das lutas, e sobretudo em como as filma e monta de maneira compreensível ao espectador, se aproveitando da geografia local e do próprio cenário ao entorno, ainda que as vezes soe um pouco artificial.
É um bom experimento de direção enquanto cineasta iniciante, de alguém com ideias refrescantes, diferentes, e uma abordagem diferente do cinema de ação oriental, através de lentes brasileiras e contemporâneas.

Temporada de Caça (Idem, 2025)
Direção: João Italo
Origem: Brasil
Avaliação: 2.5/5
Poucas coisas na vida são mais assustadoras do que a chegada de uma ditadura. O caos político. A restrição - e mais, a supressão - das liberdades. A incerteza.
Em Temporada de Caça, essa atmosfera é muito bem estabelecida por João Ítalo, na forma de pessoas que decidem se tornar resistência. É de um impacto político-social forte, trabalhado sob o olhar da fantasia e da sugestão do sobrenatural. Mas é um filme que, por outro lado, vive apenas de estabelecimentos e expectativas, sem nada mais do que aquilo que seria um primeiro momento. Entendo e respeito a ideia, mas frustra ao delegar toda a continuidade exclusivamente à imaginação do espectador.

Umbilina e Sua Grande Rival (Idem, 2024)
Direção: Marlom Meirelles
Origem: Brasil
Avaliação: 4.5/5
Chega a ser emocionante a maneira como Umbilina e Sua Grande Rival condensa uma inspiração no conto d’O Mercador e o Gênio, oriundo da literatura árabe e parte da clássica antologia As Mil e Uma Noites, com um estilo puramente brasileiro, mais especificamente nordestino, digno de um cordel.
Entre o aspecto católico fervoroso do Sertão, a crença num futuro melhor, e na própria mitologia local, Marlom Meirelles constrói um ambiente acolhedor pela presença sempre doce e amigável de Marcélia Cartaxo, ao mesmo tempo em que retrata com dor o aspecto hostil de uma região seca, onde a fome e a sede são responsáveis por constantemente ceifar parte da população.
O conflito que se estabelece no plano fantástico reforça o poder da crença de sua protagonista, uma típica e preocupada mãe do Sertão, que teme deixar sozinho no mundo seu único filho. Por detrás de um duelo poético com a morte, também excelente na pele de Zezita Matos, há muita ternura no olhar do cineasta para com seus personagens. Um curta emocionante, e de certa forma épico, na melhor das formas.

Instinto Paterno (Instinto Paternal, 2025)
Direção: Nacho Martínez
Origem: Espanha
Avaliação: 4/5
O que se inicia em Instinto Paterno como uma experiência que se situa em um "vale da estranheza", aos poucos toma rumos cada vez mais violentos e perturbadores a partir da fragilidade das relações em cena - sobretudo do casal, que contrata da protagonista os serviços.
O aspecto “found footage” adotado pela direção de Nacho Martinez na prática pouco revela ou acrescenta à verossimilhança daquilo que se conta, mas como exercício formal oferece uma muito bem-vinda dose extra de apreensão e mistério, especialmente no tocante às consequências de toda a situação de crise construída. É bem divertido enquanto imprevisível, e irônico pelo desfecho nos créditos.

Baby Blues – Going Dark (Idem, 2025)
Direção: James P. Gleason
Origem: EUA
Avaliação: 4/5
O consultório do dentista já não é naturalmente o mais amigável dos ambientes. Consciente de tal fato, o cineasta James P. Gleason busca tornar os minutos iniciais em algo leve e descontraído ao protagonista, prestes a retirar um dente do ciso. Mas a medida em que avança, o que parecia uma simples operação de extração revela um caminho cada vez mais obscuro, e além, absurdo.
Nos olhos do personagem, o desespero se concentra em uma situação que avança para a tortura, em um body horror capaz de agonizar pelo excelente trabalho de maquiagem, e mais ainda pela maneira como o sarcasmo encontra espaço entre a violência e o desespero da extração de órgãos sem anestesia.
É uma experiência repleta de agonia e tensão pelo incomodo e provocação, especialmente do estômago. Só fiquei pensando se o personagem de Bill Murray em Little Shop of Horrors gostaria ou não de uma passagem com as "médicas" deste filme.

Ataques Psicotrônicos (Idem, 2024)
Direção: Calebe Lopes
Origem: Brasil
Avaliação: 4.5/5
Na estética que mescla elementos do Expressionismo Alemão com traços do terror típico dos EUA e Inglaterra dos anos 30/40, os Ataques Psicotrônicos de Calebe Lopes brincam com a ficção científica e a atmosfera de conspiração para tratar sobre as vulnerabilidades dos seres humanos, e as maneiras como constroem as próprias relações uns com os outros.
Com grandes e intensos trabalhos de atuação por parte de Jane Cruz e Ednei Alessandro, suas contradições são expostas diante da câmera enquanto investigam os supostos ataques alienígenas, do aspecto religioso ao científico, ao mesmo tempo que sofrem destes as consequências. É um thriller de terror que vai além do intenso, ao transpassar dos limites da tela, e a partir do sofrimento dos personagens, incomoda o espectador. Um grande curta!

Tente Sua Sorte (Idem, 2025)
Direção: Guenia Lemos
Origem: Brasil
Avaliação: 3.5/5
O clima de tensão constante em Tente Sua Sorte funciona muito bem diante da claustrofobia que a direção de Guenia Ramos constrói no entorno de um elevador e andares de um prédio.
A dinâmica estabelecida é simples, e o terror se manifesta na forma do desespero e humilhação aos quais se submete a protagonista, em uma jornada surreal que revela sua verdadeira face nos instantes finais, com uma reviravolta conclusiva da metáfora.
Ainda que por vezes soe óbvia, existe um fundo de verdade em seu objetivo na denúncia do assédio sexual e da violência contra a mulher. É para provocar e conscientizar, e isso o curta faz muito bem.

Se Eu Tô Aqui É Por Mistério (Idem, 2024)
Direção: Clari Ribeiro
Origem: Brasil
Avaliação: 3/5
Eu gosto muito da atmosfera construída por Clari Ribeiro em Se Eu Tô Aqui É Por Mistério, em uma mescla criativa de elementos cyberpunk com traços que referenciam os giallos italianos, e mais ainda, um movimento queer de bruxas lutando contra a própria extinção por um grupo preconceituoso e de caráter fascista.
Por vezes, até existe um ar saudosista de uma boa temporada de American Horror Story (e aquele apelo queer típico do Ryan Murphy), o que traz, para mim, uma certa sensação nostálgica da adolescência. Mas acho que tudo isso teria muito mais potencial para ser aproveitado em um longa-metragem do que um curta, cujas referências restaram vazias, e o próprio universo desperdiçado em tamanha simplicidade para a resolução e desenvolvimento.
Na verdade, fico muito, mesmo, na torcida pela adaptação deste curta e futura produção de um longa nessa pegada por Clari (como já aconteceu, inclusive no Brasil – vide O Melhor Amigo, de Allan Deberton), que provou ser possível fazer muito com orçamento limitado (para a proposta) e ótimas locações da cidade do Rio de Janeiro.

Sem Fantasia (Idem, 2024)
Direção: Pedro Murad e Daniel Herz
Origem: Brasil
Avaliação: 3/5
Talvez em Sem Fantasia subsista mais uma ideia do que efetivamente um bom curta-metragem, enquanto a discussão que propõe, sobre o apagamento histórico e populacional de determinadas parcelas dos moradores de uma comunidade em uma grande metrópole, para a construção de novos condomínios, acabe soterrada pela história de um amor inacabado.
Por um lado, há nitidamente um elemento de resistência por parte da personagem de Marly Monteiro Klein, mas por outro, seus diálogos para com Eduardo Moscovis, depois de certo tempo, tornam-se redundantes, quando o próprio filme parece ter encerrado sua ideia, se estendendo a um ponto desgastante.
A ideia da inexistência de fantasia chega a ser até irônica ao construir um curta de “contra-fantasia” (ainda que exista um elemento de, claramente). É interessante como exercício de atuação e decupagem, mas fica claro que os diretores Pedro Murad e Daniel Hertz não souberam como ir além da proposta.






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