top of page

16º FESTIVAL CINEFANTASY | Ogiva: O Mundo Não É Mais Nosso, de Cadu Rosenfeld (Idem, 2025)

  • Foto do escritor: Henrique Debski
    Henrique Debski
  • 17 de set.
  • 4 min de leitura

Situado em um mundo pós-apocalíptico, Ogiva escapa da obviedade ao, através da tragédia, buscar pelo sentimentalismo e razões de sobrevivência de sua protagonista.


ree

 

Nesses últimos anos, tem sido bastante comum, em especial nos Estados Unidos e Canadá, produções pós-apocalípticas de médio orçamento voltadas à sobrevivência de personagens em um mundo devastado por alguma praga. O que muda, na imensa maioria das vezes, é, para além dos fatores que levaram a tanto, a ameaça que os cerca. Por vezes, apenas os seres humanos já dão conta do recado, com sua índole questionável e egoísmo, em tentar se salvar em detrimento do próximo; e em outros casos, existem também criaturas e monstruosidades com as quais precisam lidar.

 

Provavelmente essa onda começou após o sucesso de Um Lugar Silencioso (2018), acompanhado pela Netflix no final daquele ano com Birdbox (2018). Desde então são frequentes narrativas semelhantes, podendo-se destacar, nesses últimos anos, para além das sequências dos citados, longas como Arcadian (2024), The Well (2025), e agora o retorno de Extermínio, com uma nova trilogia em uma mesma pegada.

 

O mais difícil, atualmente, tem sido encontrar obras nesse formato que escapem da obviedade, daquela fórmula pronta de sobrevivência e núcleo familiar que tem sido constantemente desgastada a cada novo filme idêntico lançado. Por sorte, podemos dizer que nosso representante brasileiro pós-apocalíptico do ano, Ogiva: O Mundo Não É Mais Nosso consegue encontrar espaço para se destacar ao se interessar menos pela realidade que constrói, e mais na dor dos personagens, ao encontrarem-se perdidos em um mundo sem perspectiva, no qual praticamente não há para onde correr.

 

Já nos primeiros instantes, a direção de Cadu Rosenfeld já demonstra atenção para situar Ogiva em uma realidade puramente brasileira. De uma simples placa caída ao chão indicando a cidade de Indaiatuba, interior de SP, a 6km de distância, manchada com sangue às palavras de que o mundo não mais a nós pertence, até o cenário rural, com as residências rústicas tipicamente locais, das paredes em barro à própria decoração, envelhecida e suja diante do contexto, é capaz de nos levar diretamente ao universo que estabelece, a partir de nossa vivência como brasileiros. O poder da autoidentificação é crucial para que consigamos enxergar o universo do longa como possível, e imergir em sua proposta de explorar as monstruosidades e a destruição, fruto de criaturas misteriosas, mas também da mão humana.

 

Com duração aproximada de apenas sessenta e cinco minutos (descontando os créditos finais), o roteiro de Ogiva, adaptado dos quadrinhos de Bruno Zago pelo próprio, junto do diretor Cadu Rosenfeld, aproveita o uso de seu tempo não para explicações verborrágicas do universo, mas tão somente o essencial para que nele não caiamos de paraquedas, quando a intenção é justamente direcionar sua atenção à protagonista, e sua busca pelas razões de viver.

 

Ao mesmo tempo que lentamente introduz suas ameaças, até de maneira segmentada por capítulos, como um jogo de videogame, onde a cada nova fase há de se enfrentar um novo inimigo perseguidor, e mais perigoso, o maior interesse de Ogiva está em explorar as cicatrizes da tragédia pessoal de Pilar, muito bem interpretada por Sara Antunes, enquanto incessantemente, diante do luto, busca naquela realidade uma razão para continuar a sobreviver, na base da ajuda ao próximo, evitando pensar no passado, e se concentrando no presente.

 

Na mesma medida em que precisa lidar com as monstruosidades que agora habitam o planeta devastado, também precisa lidar com os seres humanos que nele restam, diante da eterna dúvida sobre em quem confiar, e nas verdadeiras intenções de quem encontra pelo caminho. Enquanto alguns se preocupam em sobreviver, e se reunir na tentativa de progredir com a espécie humana, e reconstruir, no limite do possível, uma sociedade, outros cederam à solidão, e enfraquecidos, passaram a enxergar os monstros como deuses, agarrando-se na necessidade de sempre buscar por forças superiores em que acreditar, como um verdadeiro escapismo à realidade, na forma de uma adaptação deturpada do real – não muito diferente do que já assistimos no presente, e por diversas outras vezes, no passado.

 

Esse elemento de horror cósmico acaba muito bem trabalhado dentro da narrativa pelo aspecto visual, a partir de efeitos extremamente caprichados (que até “dão de dez” em muitas produções norte-americanas por aí), e sobretudo pela direção de arte, nas vestimentas e armaduras improvisadas, e na própria maquiagem. Nesse sentido, existe uma notável inspiração da direção, nos momentos de ação e violência, do faroeste, aqui em um aspecto futurista, e na câmera lenta típica de John Woo a Zack Snyder, como forma de construir tensão a partir dos confrontos pessoais que lentamente se escalam, trabalhados em meio ao drama a partir de trilha ao fundo, e ao clima de desespero instalado em cena.

 

Dessa maneira, bem se utilizando do orçamento disponível, Ogiva funciona como uma grande introdução ao que poderá ser uma bem-sucedida franquia de longas, e mesmo atrair interesse ao material base – os quadrinhos. Em um ano no qual o cinema fantástico brasileiro vem demonstrando crescimento exponencial, em produções que apostam no terror, na fantasia e na ficção-científica, obras como Ogiva nos fazem encher os olhos, sentir orgulho, e sobretudo, mostram que estamos no caminho certo.

 

Avaliação: 3.5/5

 

Ogiva: O Mundo Não É Mais Nosso (Idem, 2025)

Direção: Cadu Rosenfeld

Roteiro: Cadu Rosenfeld e Bruno Zago, adaptado de Bruno Zago (quadrinho)

Gênero: Terror, Thriller, Ficção Científica

Origem: Brasil

Duração: 80 minutos (1h20)

16º Festival Cinefantasy

 

Sinopse: Quando os monstros chegaram, as ogivas foram lançadas. Quase uma década depois, a ex-policial Pilar luta por sobrevivência em um mundo devastado, agarrada aos fragmentos de esperança que ainda lhe restam, enquanto um novo propósito brota em seu coração. Entre criaturas alienígenas e homens sem sanidade, o grande conflito de Pilar permanece em sua própria cabeça: Qual a razão de continuar lutando?

Comentários


© 2024 por Henrique Debski/Cineolhar - Criado com Wix.com

bottom of page