24º TRIBECA FILM FESTIVAL | Birthright, de Zoe Pepper (Idem, 2025)
- Henrique Debski
- há 2 dias
- 3 min de leitura
Zoe Pepper transforma nosso riso em desconforto enquanto Birthright explora as relações entre pais e filhos como um reflexo da criação.

Em um primeiro momento, Birthright se apresenta como uma comédia, na qual um jovem casal, com a mulher grávida e o bebê prestes a nascer, dirige para a casa dos pais dele em busca de abrigo, enquanto tiveram um problema com a mudança e só conseguirão entrar na casa nova em algumas semanas. Em um bairro de classe média alta com aparência opressora e repleto de residências suntuosas, os pais, surpresos com a chegada inesperada do filho, e com a casa em reforma, além de não parecerem muito amistosos, também não parecem felizes com a situação, mas acolhem os acolhem de qualquer maneira.
Com o clima desconfortável instalado no ar desde os primeiros instantes, cada minuto dentro daquela residência é como mais um passo em direção a um abismo inevitável, cruzando para cada vez mais longe o ponto de não retorno. A habilidosa direção de Zoe Pepper, nesse sentido, não apenas mantém o constante estado de calamidade silencioso em alerta a todo tempo, mas também manipula o espectador, através do roteiro, enquanto a realidade fática de ambos os lados, e o passado familiar, só vai sendo destrinchado na medida em que os pais e o filho interagem, aos poucos trazendo à tona suas discordâncias passadas, e especialmente o filho a verdadeira situação financeira em que se encontra com a esposa.
O que poderia ser facilmente resolvido em uma conversa sincera sentados no entorno de uma mesa – ou em uma sessão de terapia familiar – torna-se um grande elefante na sala na medida em que, em virtude da gravidez, o casal protagonista começa a tomar espaços na residência, como o único quarto com cama de casal disponível, restringindo a liberdade dos pais em sua própria casa. A partir desses comportamentos “usurpadores”, e outros igualmente deselegantes, ainda mais tendo em conta o respeito a família, ambos os casais entram em um verdadeiro cabo de guerra silencioso.
Se no princípio poderíamos acreditar que talvez os pais pudessem ser o verdadeiro problema naquela situação, exageradamente egocêntricos, materialistas ao extremo e gananciosos em relação ao que é deles, na medida em que a narrativa avança começamos a enxergar essas mesmas características também no filho, como um puro reflexo do ambiente em que foi criado, e um verdadeiro semeio ao que os pais ao longo da vida plantaram em relação a ele.
A ganância, o orgulho e o egoísmo vêm de ambos os lados, como em uma luta com o espelho, pelo controle do que creem ser deles por direito. Ainda que haja uma clara separação, juridicamente falando, entre o que pertence aos pais, vivos, e o filho, todos acreditam ser aquela casa fruto do próprio direito.
O mais divertido é que, em meio a essa tensão, é sempre impossível antever ao próximo passo a ser tomado pela narrativa. Sempre que acreditamos seguir para um caminho, o filme faz questão de se direcionar a qualquer outro lado, pronto para nos surpreender com algo que poderá complicar ainda mais o conflito em tela, chegando a um ponto no qual até uma cena em que uma personagem simplesmente aplica maquiagem em outra torna-se incômoda, pela carga dramática e emocional nela envolvida, enquanto a decupagem de Zoe Pipper se diverte com o desconforto que habilmente causa ao espectador nas trocas de olhares e julgamentos recíprocos.
Com uma escolha final provocativa, fruto de uma consequência sempre iminente no contexto retratado, mas que nunca parece ser a direção seguida, Birthright encerra sua narrativa com a mais clara demonstração de sua metáfora, em meio a violência velada que ocorre entre pais e filhos a todo momento desde as primeiras interações. Apesar de intenso – e que para alguns pode até soar de mau gosto -, reflete precisamente o fato de serem os filhos reflexo da residência dos pais, da própria criação e do ambiente familiar, sendo tudo, desde o princípio, uma grande consequência das escolhas familiares em relação a criação do protagonista, de seu nascimento até a vida adulta.
Avaliação: 4/5
Birthright (Idem, 2025)
Direção: Zoe Pepper
Roteiro: Zoe Pepper
Gênero: Thriller, Comédia
Origem: Austrália
Duração: 90 minutos (1h30)
24º Tribeca Film Festival
Sinopse: Sem casa e desempregado, Cory e sua esposa grávida são forçados a morar com os pais dele. À medida que a estadia do casal mais jovem se prolonga, os pais começam a se preocupar que o filho, decepcionante, nunca mais sairá da casa. Desesperado para provar seu valor, Cory tenta provar seu valor, ainda que isso possa lhe custar tudo. (Fonte: CLU Collective Communications - Adaptado)
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