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24º TRIBECA FILM FESTIVAL | One Spoon of Chocolate, de RZA (Idem, 2025)

  • Foto do escritor: Henrique Debski
    Henrique Debski
  • há 6 horas
  • 4 min de leitura

A partir de uma base promissora, One Spoon of Chocolate não consegue aprofundar suas discussões, e tampouco ir além de suas inspirações.


 

Logo em seus minutos iniciais, One Spoon of Chocolate já antecipa ao espectador o destino do personagem de seu prólogo, ao colocá-lo diante de um mundo em preto e branco, onde, na composição do plano, apenas uma única cor não se apaga: o vermelho de sua jaqueta. Creio que não haja maneira mais clara de revelar seu destino, ao ser direcionado a uma armadilha.

 

Passado o prólogo, conhecemos então o protagonista, Unique, interpretado por Shameik Moore, um ex-soldado que acabara de sair da prisão em liberdade condicional, e, tentando ficar longe de problemas, viaja ao estado de Ohio para morar com seu primo em uma cidade pequena no interior, apenas para se deparar com um grupo de criminosos racistas, estabelecendo-se um conflito cada vez mais perigoso.

 

Neste thriller de ação, fica estampada a intenção por parte do cineasta Robert Fitzgerald Diggs (que assina como RZA) em tentar reviver, aos olhos contemporâneos e com uma nova roupagem, os antigos blaxploitation norte-americanos dos anos 1970/80, na base de uma narrativa violenta que constrói-se no entorno da fictícia cidade de Karensville (e a referência do nome não é por acaso), em uma guerra racial velada que nos remete diretamente aos mais ordinários e obscuros momentos do século XX.

 

Quando se encaminha para algumas passagens formalistas, o discurso de RZA soa sarcástico pela maneira como trabalha, com uma certa artificialidade incômoda e proposital, o aspecto racista internalizado na cultura da própria cidade e em sua população, ao sentarem em lados opostos nos bancos da igreja local, por exemplo, onde todos se encontram aos domingos, ou mesmo o fato de todos os órgãos estatais do local serem compostos apenas por pessoas brancas. Ao mesmo tempo, esse sarcasmo explicita justamente uma forma de preconceito e discriminação silenciosa que se manifesta no berço da terra da liberdade, um país dito seguro – a depender da cor da pele.

 

Por outro lado, enquanto o discurso visa essa atmosfera verossímil, o mistério pelo qual RZA se utiliza para construí-lo já não é tão sólido, na medida em que manifesta clara dificuldade para conseguir ir além, ou mesmo se desprender de sua inspiração – já que evoca uma atmosfera muito similar aos filmes de Jordan Peele, sobretudo Corra, e, especialmente, não consegue segurar seus segredos por muito tempo.

 

Dessa maneira, todas as respostas se dão gratuitamente de forma muito rápida, com inúmeros elementos explicativos, verbais e visuais, colocados em tela a todo o tempo de maneira a esclarecer, por mais de uma vez, quem está por trás dos eventos, como e até o porquê. Nisso, pouco é deixado ao espectador para refletir acerca do que acontece naquela cidade, ou mesmo tentar juntar mentalmente, por conta própria, as peças do quebra-cabeças, quando o próprio filme já faz isso, até subestimando nossas capacidades interpretativas. Essa antecipação é tamanha, ao ponto do longa se esclarecer ao público antes mesmo dos personagens descobrirem sobre e com o que estão realmente lidando, gerando um afastamento quando nunca nos sentimos com ele, mas somente os observando, a distância.

 

E ainda que o clima de tensão se construa de maneira eficiente, no estilo “slow-burn”, a montagem, além de entregar os segredos da narrativa ao público de maneira muito rápida, também se atrapalha nas cenas de ação, nas quais a direção de RZA, ao movimentar em demasia a câmera, com uma decupagem ao estilo anos 2000, torna difícil de compreender o que acontece em cena, ao ponto de a própria geografia dos ambientes, sobretudo da batalha final, se tornar um empecilho à narrativa, no quesito confusão, reduzindo justamente o potencial de impacto e imersão.

 

Ao chegar no final, One Spoon of Chocolate tem a oportunidade em mãos de provocar um diálogo de seu protagonista com um dos vilões principais. A ideia de transmiti-lo para mais pessoas, dentro da narrativa, oferece um questionamento interessante de autorreflexão, a qual o longa, no entanto, parece temer se debruçar. O encerramento abrupto pode ser uma forma interessante de surpreender o espectador em um primeiro momento, mas, de fato, soa como falta de criatividade a seu realizador para encontrar uma solução que não fosse contraditória ao próprio discurso. É como se RZA percebesse estar diante de um impasse consigo, e, ao invés de se esforçar para solucioná-lo, desistisse do mesmo sob o pretexto de “deixar a cargo do espectador” com um final aberto – sendo que o indício deixado do que acontece ao fim, não confirmado, deixa o longa a um passo de transformar seu discurso dito progressista em reacionário.

 

Assim, apesar das boas ideias, One Spoon of Chocolate é um daqueles projetos cujas boas intenções, das quais o inferno está cheio, não conseguem se distanciar das próprias inspirações, assumindo um ar de pouca originalidade e até amadorismo. Nada, por exemplo, que outros longas recentes, como Corra! ou Rebel Ridge já não tenha feito, de maneiras melhores e com mais complexidade nas discussões que propõe, especialmente ao aceitar e assumir um lado, ao final da história.

 

Avaliação: 2.5/5

 

One Spoon of Chocolate (Idem, 2025)

Direção: RZA

Roteiro: RZA

Gênero: Ação, Thriller, Drama

Origem: EUA

Duração: 112 minutos (1h52)

24º Tribeca Film Festival (Escape from Tribeca)

 

Sinopse: Um ex-militar condenado, recém saído em liberdade condicional, busca por um recomeço em uma pequena cidade no interior do estado de Ohio, onde mora seu primo. Mas ao se depararem com um grupo criminoso racista, inicia-se um conflito que avança de maneiras cada vez mais perigosas.

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