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24º TRIBECA FILM FESTIVAL | Re-Creation, de Jim Sheridan e David Merriman (Idem, 2025)

  • Foto do escritor: Henrique Debski
    Henrique Debski
  • 11 de jun.
  • 4 min de leitura

Re-Creation se contradiz ao aumentar o sensacionalismo no entorno de um caso real nunca solucionado quando fantasia um julgamento fictício.


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Ficção para questionar a realidade” é como o slogan de Re-Creation define o longa. A partir de um controverso caso real, ocorrido na Irlanda e nunca verdadeiramente solucionado, os roteiristas e diretores Jim Sheridan e David Merriman imaginam como poderia se dar a deliberação de um júri, composto por doze pessoas, para chegar a um veredito em relação a acusação do principal suspeito.

 

O assassinato da cineasta francesa Sophie Toscan Du Plantier, no litoral irlandês, em 1996, é até hoje um dos grandes mistérios criminais do país. Malfadado ao fracasso pela inexperiência da polícia local, e pelas próprias circunstâncias do crime, em que pese o jornalista local, Ian Bailey, figurar como o principal suspeito, nunca se chegou a qualquer conclusão em relação a verdadeira autoria do delito, e tampouco, na Irlanda, alguém chegou a ser julgado.

 

Nessa esteira, da incerteza e do mistério nunca solucionado, os diretores, através da ficção, imaginam uma realidade paralela, em que Bailey é levado a julgamento na Irlanda, acusado de ser o autor do homicídio de Sophie. Assim, seguindo o rito processual local, doze jurados são convocados para deliberar, a partir dos fatos e alegações da acusação e da defesa, sobre a condenação ou absolvição do réu pelo crime em questão, em um veredito obrigatoriamente unânime.

 

A primeira obra que buscou por uma abordagem voltada, essencialmente, à deliberação dos jurados diante de um crime grave foi o clássico absoluto do cinema Doze Homens e uma Sentença (1957), dirigido por Sidney Lumet, e adaptado da peça de Reginald Rose. Refilmado por diversas vezes ao longo das décadas, creio que a mais relevante, desde o lançamento da obra original, se deu exatos quarenta anos mais tarde, quando William Friedkin readaptou a peça em 1997, em um filme para a televisão, sob uma sociedade mais progressista e evoluída em questões de igualdade, composta por homens brancos e negros debatendo sobre o crime, e, inevitavelmente, compartilhando as próprias visões de mundo.

 

Agora, quase trinta anos após a versão de Friedkin, é impossível não enxergar a proposta de Re-Creation como uma espécie de sucessora espiritual, enquanto parte dos mesmos pressupostos e segue, a risca, os mesmos passos da narrativa escrita por Reginald Rose, mas com suas particularidades, incluindo tratar-se de um caso real e a composição mista dos jurados, pessoas com idades, gêneros, cores de pele e até nacionalidades distintas.

 

Por um lado, a ideia de trazer para discussão um caso real e fantasiar um julgamento funciona quase como um júri simulado de uma atividade universitária ou educativa, colocando à mesa os autos processuais e deixando que se construa um debate no entorno dos fatos, com acusação, defesa e um juiz. Acontece que uma coisa é deixar que os alunos – e aqui, os espectadores – trabalhem com os fatos (integrais) e tirem conclusões; outra, é direcioná-los a fim de que sejam convencidos, justamente o que acontece aqui.

 

Enquanto uma história fictícia, é plenamente possível assumir que todos os fatos, provas e discussões trazidas pela obra sejam verídicas, e necessárias para que o filme chegue à conclusão que pretende, diante das informações que o próprio roteiro produz e tem como suficientes, na intenção de, na verdade, usar do contexto de tribunal para explorar seus personagens, os jurados.

 

Porém, quando se utiliza, para tanto, de um caso verídico, sob o pretexto de analisa-lo de uma vez por todas para chegar à uma conclusão sobre determinada pessoa ser ou não o autor do crime, o contexto inteiro se altera, na medida em que estamos diante de pessoas reais, tratando e deliberando, ainda que de maneira ficcional, sobre suas vidas. A omissão de detalhes, a criação de informações, ou o tratamento de incertezas como verdades, não são meros artifícios de roteiro, mas, diante daquilo que se propõe, torna-se, ou pode tornar-se, sensacionalismo.

 

Nesse aspecto, é interessante que Re-Creation coloca em dúvida grande parte das supostas provas que reúne, e leva, ao limite, o benefício da dúvida em relação a Ian Bailey, eticamente o melhor dos caminhos. Mas na mesma medida em que critica o sensacionalismo midiático da época, responsável inclusive pela suspeita do jornalista, corre também o risco de nele incorrer, ainda mais quando o texto mostra dificuldades em abordar os fatos com clareza, sempre o intercalando em meios aos dramas pessoais dos personagens, que na maior parte das vezes não vai além do que Lumet ou Friedkin já fizeram com mais criatividade no passado, ainda que haja um esforço do elenco para trabalhar profundidade nas emoções de seus personagens – especialmente por parte de Vicky Krieps, que assume, de certa maneira, o protagonismo.

 

Assim, com uma proposta que se enquadra no limiar da ficção com o documentário, pendendo mais à primeira, pouco de fato se faz uma análise da realidade, talvez pelo filme se interessar mais pelo corpo de jurados do que efetivamente pelo caso real em debate. Sem muita clareza ou organização na abordagem dos fatos, que constantemente se mistura nas vidas dos personagens e suas vivências, tanto Re-Creation não vai muito além do que Doze Homens e uma Sentença já fizera no passado, em relação aos jurados; quanto pouco também se debruça sobre o mistério verídico debatido, por vezes caindo na própria armadilha de aumentar um teor sensacionalista por detrás da morte de Sophie Toscan Du Plantier, chegando a uma conclusão óbvia desde o princípio em razão da fórmula adotada, do que efetivamente buscando por uma solução definitiva para um julgamento, trabalhando o debate da maneira mais óbvia e superficial possível.

 

Avaliação: 2/5

 

Re-Creation (Idem, 2025)

Direção: Jim Sheridan e David Merriman

Roteiro: Jim Sheridan e David Merriman

Gênero: Drama, Thriller

Origem: Irlanda, Luxemburgo

Duração: 89 minutos (1h29)

24º Tribeca Film Festival (Spotlight Narrative)

 

Sinopse: Em um julgamento fictício, doze membros de um júri devem decidir se o jornalista britânico Ian Bailey é culpado pelo assassinato da cineasta francesa Sophie Toscan du Plantier, ocorrido em 1996. Baseado em eventos reais, o filme reconstrói, por meio das discussões entre essas doze pessoas, um caso que convida o espectador a tirar suas próprias conclusões. (Fonte: Falco Ink. – Adaptado)

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