29º FANTASIA FILM FESTIVAL | The Forbidden City, de Gabriele Mainetti (La Città Proibita, 2025)
- Henrique Debski
- há 2 dias
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The Forbidden City mescla com elegância elementos do cinema italiano com os Wuxia chineses, em thriller de ação e romance repleto de rimas narrativas.

Admito que, em um primeiro momento, fiquei um pouco preocupado com a abordagem que The Forbidden City poderia ter, considerando ser um filme italiano que busca, em sua narrativa, a mescla da cultura local com a cultura chinesa. Tradicionalmente, filmes europeus ou norte-americanos com propostas semelhantes acabam por, ainda que acidentalmente, usurpar do estilo asiático, e desvirtuar seus elementos característicos, ao ponto de se tornar algo sem identidade, que nitidamente não compreende aquilo que referencia – é só verificar uma enorme quantidade de longas nesse padrão especialmente ao final dos anos 90 e início dos anos 2000, como, por exemplo, The Replacement Killers, de Antoine Fuqua, que usurpa e reproduz, sem sucesso, o estilo de John Woo em um filme sem alma.
Mas o resultado deste passa longe desses casos problemáticos, quando é notória a preocupação e conhecimento do cineasta italiano Gabriele Mainetti para com os estilos que trabalha, sem tentar usurpar do cinema chinês, mas se inspirar em seus clássicos de ação para a construção de algo original, que, na prática, mescla muito bem sua trama de vingança com o aspecto romântico que se estabelece no entorno.
Mais do que isso, o roteiro de The Forbidden City, escrito por Stefano Bises, Gabriele Mainetti e Davide Serino é paciente no desenvolvimento de seus personagens, nas relações familiares com as quais estão ligados, e pouco a pouco vai revelando suas surpresas, enquanto uma interessante teia de personagens se conecta, e transforma o sentimento de vingança debatido em algo cada vez mais intenso, entre a sede de poder e o orgulho pessoal.
Ao mesmo tempo em que os arcos de seus dois protagonistas se encontram unidos por um fato em comum, suas trajetórias e maneiras de lidar com as próprias tragédias traçam caminhos distintos, enquanto Mei, muito bem vivida por Yaxi Liu (em um de seus primeiros trabalhos como atriz, para além dos como dublê) caminha pela ação; Marcello, vivido por Enrico Borello, vai pelo lado da investigação e diplomacia social.
Fato é que, de toda maneira, os eventos, tão bem amarrados, impedem que os personagens se afastem, e assim como estão ligados pela tristeza familiar que compartilham, tendem, também, a buscar por soluções em conjunto, cada um a seu modo. Torna-se bela a maneira como o filme estabelece rimas narrativas manifestadas através da tragédia, como se alguns eventos – e sobretudo, os romances – estivessem destinados a se concretizar, mesmo que de maneiras um tanto estranhas.
Pois é o que acontece em ao longo de toda a projeção, já que, apesar de durante boa parte do tempo separados fisicamente, Mei e Marcello compartilham de uma conexão mais profunda do que imaginam, especialmente pelas atitudes que tomam – estendendo essa rima narrativa para além do contexto familiar, mas também para suas próprias características enquanto pessoas, que fundamentam um romance ainda mais poderoso.
Ao mesmo tempo que a ação homenageia o cinema de Kung Fu, e cria uma espécie de Wuxia nos tempos contemporâneos, tanto pelos eixos temáticos quanto pela preocupação nas coreografias e numa violência visceral, até mais psicológica do que gráfica, o cinema italiano encontra seu espaço a partir de suas típicas histórias de máfia (ao exemplo de que apenas os personagens italianos portam armas de fogo), tradições familiares e a própria trilha musical, que colabora na intersecção entre as duas culturas.
Assim, há um aspecto muito poético na tragédia de The Forbidden City, em uma espécie de melodia nas mortes que se manifesta através das rimas narrativas contidas em seus paralelos da relação passado-presente que estabelece, mesclando, com muita habilidade e sabedoria, o melhor do cinema de cada país, do drama, romance e até a ação, de tal forma que poucos cineastas seriam capazes, com tanto apreço e cuidado com a história sendo contada, que se encerra de forma muito bem amarrada. Mais uma agradável surpresa do Fantasia Film Festival.
Avaliação: 4/5
The Forbidden City (La Città Proibita, 2025)
Direção: Gabriele Mainetti
Roteiro: Stefano Bises, Gabriele Mainetti e Davide Serino
Gênero: Ação, Drama, Romance
Origem: Itália
Duração: 138 minutos (2h18)
29º Fantasia Film Festival (Cheval Noir)
Sinopse: Nos subúrbios de Roma, duas almas muito diferentes se cruzam. Uma é o filho do dono de um restaurante italiano tradicional, que desapareceu com sua amante. A outra é uma jovem misteriosa que veio da China em busca de sua irmã desaparecida. (Fonte: TMDB - Adaptado)
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