49ª MOSTRA DE SP | Nouvelle Vague, de Richard Linklater (Idem, 2025)
- Henrique Debski

- 31 de out.
- 3 min de leitura
Com Nouvelle Vague, Richard Linklater conta sobre a produção de Acossado e do nascimento de Jean-Luc Godard como diretor revolucionário, em drama que não capta o espírito do período que retrata.

Em uma época na qual tem sido bastante comuns as “cartas de amor ao cinema” pelas mãos de diversos cineastas, usando da metalinguagem para contar sobre suas inspirações e paixões pela sétima arte através da própria , Richard Linklater explora sua paixão pelo cinema francês em Nouvelle Vague, ao fazer uma espécie de sua própria versão de Mank (2020), de David Fincher, e contar sobre um jovem Jean-Luc Godard nas vésperas de produção de seu primeiro longa-metragem, o revolucionário Acossado (1960).
Por um lado, é estranho pensar em Linklater envolvido em uma produção como tal, francesa demais para um cineasta tão norte-americano. Por outro lado, parece também que, mesmo norte-americano, seria um nome do país ideal para conduzir o projeto, quando justamente um diretor que, ao longo da carreira, sempre se mostrou muito disposto a experimentar e trabalhar com estilos diversos, através de ficções, animações e documentários, e por diversas vezes desafiou, e repensou, no conceito de tempo no cinema.
Até certo ponto, existe um pouco desse Linklater inspirado em Nouvelle Vague, na forma como deixa claro desde o primeiro instante não buscar por um retrato estritamente fiel de Goddard, mas uma caricatura respeitosa do cineasta, em sua infinita arrogância e confiança que depositava no entorno de seu grande projeto de longa-metragem, diferente de tudo o que já havia sido visto.
Há, porém, um outro lado de Goddard visto por detrás dos óculos escuros, em cena a todo momento: o de um homem também inseguro consigo, com seu projeto, com essa revolução cinematográfica que tanto almeja, sobretudo depois de assistir aos longas de amigos como François Truffant e Claude Chabrou. O reflexo desses diretores e de seus longas nos óculos de Goddard fazem do adereço uma espécie de máscara da autoconfiança – e mais, um reflexo da ambição do protagonista.
Com elementos estilísticos que nos remetem a uma espécie de documentário de filmagens – como a câmera interagindo com o ambiente como mera
espectadora, e a introdução dos personagens por seus nomes em tela e uma pose, como se tirassem uma foto –, a direção de Linklater, porém, não atinge um nível de inspiração que se aproxime do período que retrata. Talvez por estar um tanto longe de seu país de origem, ou pela preocupação em tornar seu filme menos proibitivo do que, em partes, já o é, o diretor toma escolhas formais bastante padrões até mesmo para seu próprio cinema, e sem abraçar tanto a revolução formal da Nouvelle Vague, trilha um caminho de reencenar momentos icônicos da produção e narrar, de maneira leve e um tanto descontraída, os desafios dos bastidores, envolvendo o produtor, a equipe e a forma de trabalhar do próprio Godard.
Nesse sentido, Nouvelle Vague até funciona enquanto um drama bem humorado e metalinguístico sobre a produção de um dos filmes mais importantes da História do cinema, e do nascimento de Godard como um diretor revolucionário - inclusive muito bem vivido por Guillaume Marbeck em seu primeiro trabalho no cinema -, mas esse formato excessivamente hollywoodiano, vindo de um diretor norte-americano conhecido por se esquivar do óbvio, parece não se encaixar, e menos ainda dialogar, criativamente com a história contada, e sua relevância. Enquanto alguns definem a obra como o “vingadores da cinefilia” (o que não deixa mesmo de ser, afinal), como o faz o amigo, professor e crítico Márcio Sallem, prefiro enxergar Nouvelle Vague como um “Godard para iniciantes”, e se ao menos despertar o interesse do grande público que assistir ao filme para conhecer a obra do cineasta e seu movimento artístico, creio que o longa terá atingido, para além da homenagem, seu maior efeito.
Avaliação: 3/5
Nouvelle Vague (Idem, 2025)
Direção: Richard Linklater
Roteiro: Vince Palmo, Holly Gent, Laetitia Masson e Michèle Pétin
Gênero: Drama, Comédia
Origem: EUA
Duração: 106 minutos (1h46)
49ª Mostra de São Paulo
Sinopse: Depois de escrever para a Cahiers du cinéma, o jovem Jean-Luc
Godard decide que fazer filmes é a melhor forma de crítica cinematográfica. Ele convence o produtor Georges de Beauregard a financiar um longa de baixo orçamento e cria, junto ao colega da Nouvelle Vague François Truffaut, um argumento sobre um casal de gângsteres. O resultado? Acossado, um dos primeiros longas da Nouvelle Vague francesa.





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