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49ª MOSTRA DE SP | Pai, Mãe, Irmã, Irmão, de Jim Jarmush (Father, Mother, Sister, Brother, 2025)

  • Foto do escritor: Henrique Debski
    Henrique Debski
  • 15 de nov.
  • 4 min de leitura

Em três histórias, Jim Jarmush extrai pouco de Pai, Mãe, Irmã, Irmão, preocupando-se mais com as relações formais entre elas, e propagandas de marcas famosas, do que realmente com aquilo que pretendem contar.


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A competitiva deste ano do Festival de Veneza foi tomada por polêmicas, fofocas e especulações. Enquanto A Voz de Hind Rajab conquistava as lágrimas e os aplausos do público, esperando-se que recebesse o prêmio máximo, boatos indicavam que discussões e até brigas entre os membros do júri aconteciam a fim de evitar a premiação de uma obra tão política. Entre uma seleção interessantíssima, seja lá qual fora o impasse – se é que realmente existiu -, fato é que a decisão final foi de premiar o novo longa de Jim Jarmush, Pai, Mãe, Irmã, Irmão, com o Leão de Ouro – e talvez o filme menos político dentre todos, justamente reforçando uma linha de que tudo isso pode mesmo ter acontecido.

 

Entendo, de verdade, o receio em premiar uma obra tão política em um momento de polarização mundial tão delicado – independente de minha opinião referente ao caso concreto -, mas a premiação ir para um filme tão insosso, até para um diretor veterano como Jarmush, decepciona frente aos tantos outros, mais interessantes e originais, que poderiam ter levado a menção (fosse A Casa de Dinamite, No Other Choice, Bugonia ou até a biografia protagonizada por The Rock, The Smashing Machine eram opções viáveis).

 

Feita essa ressalva, de manifesta decepção, Pai, Mãe, Irmã, Irmão recai naquele velho pensamento que já manifestei em outras oportunidades: o trabalho com antologias é sempre algo naturalmente complicado, na medida em que, entre os diversos curtas – ou segmentos – que compõe a obra, é natural, e provável, que uns se sobreponham a outros, especialmente em qualidade. E não que as histórias aqui contadas por Jim Jarmush soem desinteressantes, mas na medida em que compartilham de elementos em comum, passagens e relações similares, pouco a pouco se esgotam na medida em que, durante quase duas horas, pouco consegue extrair sobre aquilo que busca contar.

 

Na prática, trata-se de três histórias que miram o olhar para as relações familiares, em um tabuleiro parecido, mas com algumas peças alteradas entre elas. Na primeira, “Pai”, um casal de irmãos vai visitar seu pai idoso, e um tanto ausente ao longo da vida – fica claro que os três não se conversam com frequência, e apenas se reúnem por uma obrigação moral que sentem entre si, especialmente após o falecimento da mãe; na segunda, “Mãe”, duas filhas adultas visitam sua mãe, presente, mas aparentemente bastante rígida, e tentam prova-la que alcançaram sucesso em suas vidas, à própria maneira – uma pela sinceridade, e mesmo assim sentindo-se rebaixada, e a outra a partir da mentira, omitindo parte da própria identidade; e na terceira, “Irmã, Irmão”, um casal de jovens-adultos, irmãos gêmeos, relembram da infância enquanto lidam com o luto, na medida em que acabaram de perder os pais e repensam no que fazer com suas coisas.

 

Por um lado, cada uma das histórias, se realmente bem aproveitadas, poderia dar ensejo a olhares sensíveis para relações familiares, consequências entre passado e presente, e especialmente encontram destaque na verossimilhança com a qual Jarmush, mesmo quando se aproveita de um humor muito típico seu, oferece retratos verdadeiros, de situações que realmente acontecem nos quadros familiares, sobretudo nas relações entre pais e filhos.

 

Não apenas isso, todas as histórias são marcadas por uma ausência, na forma de um buraco na vida dos personagens retratados, que se adapta conforme a estrutura das casas, e dos relacionamentos existentes entre pais, filhos e irmãos. Acontece que o mero trocar desses elementos de lugar não é capaz de sustentar três histórias que, formalmente, o diretor busca muito por forçar uma relação mais concreta. Na prática, insere ideias, contextos e situações que se repetem em quase todas elas sem um real significado, senão uma identidade comum apta a talvez justificar o fato de estarem todas inseridas dentro de um mesmo filme.

 

É a questão da ênfase nos skatistas, a presença de copos d’água em cena, brindes com bebidas distintas, dinheiro, e outras pequenas coisas que se fazem presentes em todos os momentos. Da mesma forma, também se fazem rimas narrativas, como se espelhassem essas três histórias, ou famílias, distintas, trabalhando uma assimetria nas relações das duas primeiras tramas, e se contrapondo a uma simetria com a chega dos irmãos gêmeos ao longa.

 

Mas no fim, apesar de tantos elementos em comum, por termos acesso a passagens tão curtas pelas vidas dessas famílias, e sem tanta possibilidade de explorar mais profundamente esses personagens, ou ao menos voltar-se a atenção para alguns deles de maneira mais específica, o interesse por Pai, Mãe, Irmã, Irmão vai se esvaindo aos poucos, em especial pelo como, ao longo da projeção, vai se desprendendo de uma identidade ao longo do tempo. E mais do que tudo isso, o excesso de “product placement” ao longo da obra incomoda profundamente, seja pelos diálogos que se esforçam para inserir uma menção à marca Rolex no meio (e mostrar o relógio), ou um carro Land Rover, e, de maneira mais sutil, mas visualmente gritante, os desfiles de moda da Saint Laurent, que não apenas produziu o longa, como se fez responsável, obviamente, pelos figurinos. Às vezes, chega a parecer uma peça publicitária de quase duas horas disfarçado de um drama familiar bastante padrão e relativamente vazio. Uma decepção, pelo prêmio recebido do júri no Festival de Veneza, e mais ainda por vir tamanha mediocridade de um diretor veterano como Jim Jarmush.

 

Avaliação: 2.5/5

 

Pai, Mãe, Irmã, Irmão (Father, Mother, Sister, Brother, 2025)

Direção: Jim Jarmush

Roteiro: Jim Jarmush

Gênero: Drama, Comédia

Origem: EUA, Itália, França, Irlanda, Alemanha

Duração: 110 minutos (1h50)

49ª Mostra de São Paulo

 

Sinopse: Irmãos separados se reencontram após anos separados, forçados a enfrentar tensões não resolvidas e a reavaliar seus relacionamentos tensos com seus pais emocionalmente distantes.

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