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CRÍTICA | A Verdadeira Dor, de Jesse Eisenberg (The Real Pain, 2024)

  • Foto do escritor: Henrique Debski
    Henrique Debski
  • 6 de fev.
  • 3 min de leitura

Em sua segunda direção, Jesse Eisenberg usa da relação histórica entre passado e presente para explorar A Verdadeira Dor de cada um.


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O talentoso ator Jesse Eisenberg, em 2022, fez sua estreia como diretor com o drama independente Quando Você Terminar de Salvar o Mundo, intrigante pela maneira como trabalha a ideia de projeções e expectativas dentro de uma relação mãe e filho, marcada pela incomunicabilidade, pessoal e geracional. Apesar de curto, é uma obra provocativa em como avança com as situações que propõe à alguns extremos, sem nunca perder de vista a linha da verossimilhança. Mesmo que um longa não tão marcante, e com problemas estruturais na articulação da mensagem, algumas das características de seu estilo ficaram evidentes, ainda mais agora, quando novamente aparecem em A Verdadeira Dor, um projeto pessoal e bem mais maduro.

 

Somando a experiência obtida em sua primeira aventura por detrás das câmeras, dessa vez Eisenberg assume um segundo desafio: posicionar-se também em frente a elas, enquanto precisa controlar, ao mesmo tempo, todo um set de filmagens.

 

Como fruto de uma família de judeus europeus, A Verdadeira Dor assume um caráter pessoal ao narrar a viagem de dois primos à Polônia, terra natal de sua avó, que fugira antes do início da Segunda Guerra Mundial, e precisou reconstruir a vida nos Estados Unidos de uma hora para outra. Há toda uma carga emotiva, demonstrada desde os primeiros instantes, na viagem que fazem ao passado, através dos resquícios presentes de alguns dos momentos mais assustadores da humanidade.

 

Apesar da temática do Holocausto, e da reconexão com as próprias origens, A Verdadeira Dor a que o título se refere é bem mais ampla e complexa do que algo que, hoje, vemos como o passado – o qual ainda surta preocupantes efeitos no presente.

 

Em certa medida, é sobre uma relação que se estabelece entre o antes e o agora. Uma forma de honrar, num primeiro momento, a vida e a memória daqueles que antes sofreram, se sacrificaram, e sobreviveram para que hoje possamos viver livremente, com sorrisos e respirar sem tantas preocupações ou medos. Acontece que, em outra mão, existe o lidar consigo.

 

Pode parecer reclamar de barriga cheia, quando colocamos o passado, no recorte histórico abordado pelo longa, em comparação ao presente e a situação dos personagens protagonistas, mas nunca sabemos como é viver na pele do outro. Sentir o que o outro sente.

 

É nessa ideia que concentra o foco narrativo de Jesse Eisenberg, que, assim como as demais pessoas na excursão da qual os protagonistas fazem parte, nos manipula em meio a relação com seu primo, que pouco a pouco, enquanto se aprofunda, abandona uma primeira imagem desconfortável do convívio entre eles, pessoas completamente diferentes, e antônimas, mostrando a verdadeira face dos sentimentos que expressam através das ações, as quais muitas vezes parecem indicar o contrário. É um mecanismo de disfarce poderoso, que oculta, durante muito tempo, aquilo que Benji verdadeiramente sente, em uma atuação muito versátil, e comicamente realista, do excelente Kieran Culkin.

 

Toda essa revelação entre os personagens, envolta ao natural sentimentalismo de uma reconexão com o espírito da recém-falecida avó, com quem tanto conviveram, amaram e sentem falta, vem acompanhada do ar histórico de um passado obscuro, com fantasmas pairando sob as ruas da Polônia atual. É onde o filme melhor trabalha a relação deles também com a religião, não necessariamente como fé, mas como origem, cultura e comunidade – é onde mais me atinge em um aspecto pessoal, por também ser um judeu de descendência polonesa, e até pelo envolvimento do próprio personagem de Eisenberg, o qual parece ter sido escrito pensando em si, como pessoa, e em seu arquétipo de atuação típica também.

 

Dessa maneira, em meio as sacadas rápidas de um roteiro criativo e inteligente, que provoca seu espectador na base do constrangimento e do descompasso da relação que estabelece entre os primos (algo que herda, com agora melhor polimento, de seu primeiro longa), A Verdadeira Dor, em pouco mais de oitenta minutos, chega à ideia de tentar compreender o próximo, na base da empatia, ao mesmo tempo que não se pode ignorar a própria dor pessoal porque a do outro parece ser maior. Todos nos conhecemos por quem somos, sabemos o que sentimos, e com isso precisamos aprender a viver, às nossas próprias maneiras, sempre procurando ser feliz.

 

Avaliação: 4.5/5

 

A Verdadeira Dor (The Real Pain, 2024)

Direção: Jesse Eisenberg

Roteiro: Jesse Eisenberg

Gênero: Drama, Comédia

Origem: EUA, Polônia

Duração: 90 minutos (1h30)

Disponível: Cinemas

 

Sinopse: Dois primos que não se dão bem se reúnem para uma excursão pela Polônia para homenagear sua amada avó. A aventura toma um rumo diferente quando as antigas tensões deles ressurgem contra o pano de fundo de sua história familiar. (Fonte: IMDB)

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