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IX MORCE-GO VERMELHO | Nico, de Salomón Reyes (Idem, 2025)

  • Foto do escritor: Henrique Debski
    Henrique Debski
  • 17 de nov.
  • 4 min de leitura

Em Nico, a abordagem do luto como temática central vem acompanhada de uma série de elementos mal desenvolvidos, em terror descompassado que parece o projeto de um filme inacabado.


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Tal como a morte costuma ser um elemento muito presente no cinema de terror, desde o primeiro filme do gênero, Le Manoir du Diable (1896), de George Méliès, recentemente sua abordagem muito tem-se voltado, também, ao aspecto do luto. Ainda que o fim da vida seja motivo de enorme temor para muitos de nós, seres humanos, a partida de um ente próximo, querido, é tão qual um motivo de lamento e de muita dor, especialmente a depender das circunstâncias. Tanto a temática, sempre bastante abordada ao longo dos anos, tem encontrado recentemente ainda mais destaque, que em uma contagem superficial, creio ter assistido a pelo menos seis longas do gênero, lançados em 2025, que trataram do luto como a temática central. E dentre essas seis produções, encontra-se Nico, longa uruguaio que fez sua estreia mundial no Festival MorceGO Vermelho.

 

Inicialmente, é possível compreender parte das intenções do estreante Salomón Reyes em Nico, seu primeiro filme. A cena inicial é bastante significativa, enquanto responsável por estabelecer toda a motivação da narrativa, quando o garoto Nico, uma criança de não mais que oito anos de idade, é atingido por um raio durante uma violenta tempestade em uma floresta. Não é preciso dizer o quão aquele momento repercute dores eternas no coração de seus pais, e de suas irmãs, que durante toda a vida carregarão consigo a memória do irmão falecido em um acidente trágico.

 

O retorno àquele ambiente é algo ainda mais difícil para todos os envolvidos. Se relembrar do momento já é passível de certo desespero, o retorno ao local do acidente, anos depois, e no aniversário do fato, é razão até mais dolorosa. É nesse clima de desconforto, em uma viagem de família, que o longa verdadeiramente tem início, explorando, pouco a pouco, as dores e consequências deixadas pelo fato nas vidas daqueles personagens, e o como se transformaram.

 

Mas enquanto se propõe tal olhar intimista à desestrutura familiar pós acidente, na medida em que uns culpam os outros para tentar tirar dos próprios ombros a responsabilidade por uma tragédia que, no fundo, cabe a todos – cada qual à sua própria maneira, e parcela de responsabilidade, em maior ou menor nível –, o filme se mostra incapaz de cumprir o prometido ao não saber exatamente por onde seguir, ou quais ideias colocar à mesa para debater em apenas sessenta minutos de projeção.

 

A cada nova cena, nesses instantes iniciais, Reyes decide olhar para aquela situação em que vivem sob um ângulo diferente. É a relação entre as irmãs, a briga entre os pais, que os levou ao divórcio; um estranho sacerdote; uma misteriosa pessoa ou criatura que os espreita, e até os persegue entre as sombras da floresta; um ritual para trazer os mortos de volta à vida. É uma série de ideias que, embora de alguma forma relacionadas, não conseguem encontrar um elo comum que faça sentido ou desperte o interesse do espectador.

 

Se em determinado momento os personagens possuem opiniões e intenções claras sobre a viagem e a relação familiar, à medida em que o filme avança todos parecem mudar repentinamente. Não existe uma explicação ou ao menos um fio capaz de justificar ao espectador tamanhas mudanças de comportamento, especialmente por parte de uma das irmãs, senão pelo fato de que talvez tenhamos assistido a um rascunho de roteiro, ou talvez um texto que, de tão alterado, acabou se tornando uma colcha de retalhos formado por ideias inconciliáveis, muito pouco, ou mesmo não revisadas.

 

Se não bastasse uma incompreensão referente a essa série de ideias mal trabalhadas ao longo da narrativa, a direção de Reyes parece tão perdida quanto o roteiro, sobretudo quando incapaz de construir tensão, ainda que haja oportunidades para tanto. O ambiente opressivo de escuridão daquela densa floresta nunca parece ser verdadeiramente aproveitado, senão para um ou outro susto previsível, da mesma forma que o cenário carece de uma geografia que leve o espectador para junto daquele espaço, passível de entender a distância em que se encontram os personagens uns dos outros, e de onde poderiam surgir ameaças, como o estranho cemitério abandonado, que pouco encontra relação com a história contada, senão para introduzir alguns zumbis de maneira bastante deslocada da ideia central.

 

A trilha musical, com uma boa faixa de rock intensa, caberia se o filme apresentasse momentos em que há uma crescente rítmica similar. No entanto, seus poucos instantes de ação e maior violência não chegam perto de acompanhar a música, que ainda por cima com a má mixagem do som, torna-se tão alta que abafa o áudio de gritos e ataques das criaturas.

 

Dessa maneira, com uma montagem que também não consegue colaborar no interesse do espectador, especialmente em razão da lenta progressão, para desembocar em apenas quinze minutos mais intensos na reta final; personagens confusos, com os quais é difícil se estabelecer uma relação de interesse, e, no geral, com atuações igualmente fracas; e demasiadas ideias perdidas em apenas uma hora de duração, Nico não consegue dizer a que veio. Há uma clara indecisão para definir a abordagem central, e apesar da temática delimitada, conta com muitas ideias mal aprofundadas, ou sequer propriamente trazidas à tona, que, no fim, pouco importam para um desfecho que dispensa voltas narrativas ou qualquer complexidade, mas que pode, na prática, ser lido desde os primeiros instantes. Talvez, da forma como está, até funcionaria melhor como um curta, sem tantas ideias perdidas ou elementos vazios – nesses casos, menos é mais.

 

Avaliação: 1/5

 

Nico (Idem, 2025)

Direção: Salomón Reyes

Roteiro: Salomón Reyes

Gênero: Terror, Thriller

Origem: Uruguai

Duração: 61 minutos (1h01)

IX Festival Morce-GO Vermelho

 

Sinopse: Florencia organiza um acampamento na mesma floresta onde o seu filho Nico morreu há três anos. O memorial conta com a presença das duas filhas, com quem tem uma relação complicada, e do ex-marido, de quem se separou após a morte do rapaz. Quando Florencia lhes apresenta um estranho curandeiro, a mais nova das filhas descobre que a mãe planeja realizar um ritual de invocação para ressuscitar Nico.

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