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XXI FANTASPOA | Traumatika, de Pierre Tsigaridis (Idem, 2025)

  • Foto do escritor: Henrique Debski
    Henrique Debski
  • 22 de abr.
  • 3 min de leitura

Traumatika nem sempre sabe aproveitar de seu universo, mas é eficaz na construção de um clima denso e desconfortável, entre o terror de possessão e o slasher.


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Os primeiros instantes de Traumatika buscam estabelecer a intensa atmosfera de tensão que se perdurará durante toda a exibição. O prólogo no Egito do início do século XX é como uma homenagem ao Exorcista, e nos introduz à descoberta do artefato que imergirá famílias em meio ao caos e a desgraça, quando uma criatura nefasta, aprisionada em uma espécie de lâmpada, é imprudentemente libertada a fim de dar início a sua sede de sangue e poder sobre as pessoas.

 

Tendo em vista o particular interesse do demônio Volpaazu em crianças, a citação inicial, referente às cinco formas de trauma infantil para a psicologia, realmente fazem sentido dentro daquilo que se propõe, quando a violência contra uma criança é o ponto central de parte da narrativa, em uma relação de causa e consequência que se arrasta para além de vinte anos. Inicialmente desnorteados em uma estranha linha do tempo, somos levados do Egito de 1910 para a cidade de Pasadena, nos EUA, no ano de 2003, em questão de segundos. Uma criança, em uma casa descuidada, aparentemente sofre violências constantes de uma mãe que parece estar possuída. Pouco a pouco, o filme começa a nos dar informações suficientes para que possamos, sozinhos, montar um simples quebra-cabeças, e compreender o que está por detrás de tudo aquilo.

 

As respostas, ainda que facilmente dedutíveis, não são entregues todas de uma única vez, mas na medida certa em que o filme avança. Eventualmente, a montagem, buscando por um ar dinâmico, e na tentativa de preservar os mistérios por mais tempo, se articula em um jogo que caminha entre o passado e o presente, de maneira não necessariamente tão linear, mas capaz de acrescentar uma generosa e útil camada de tensão e progressão à narrativa, buscando explorar os processos de loucura induzidos pelo antagonista aos personagens, e à maneira com a qual eles são controlados e desprovidos de qualquer meio de vontade para as ações que executam, ainda que entre momentos de lucidez, ainda mais torturantes ao portador da entidade.

 

Acontece, no entanto, que não há como não reconhecer o estranho uso que o filme faz de tantos recursos que não obedecem a uma lógica interna estabelecida, mas apenas servem como meios para trabalhar o terror que, eventualmente, acabam esquecidas pela direção de Pierre Tsigaridis, tão inventiva quanto eventualmente arbitrária na construção de seu mundo. É o caso da câmera em primeira pessoa, alternando com pontos de vista neutros, que bem estabelecem, em determinada cena, quando acompanhamos um policial (através da câmera mais alta e a luz de uma lanterna, juntamente ao revólver, que compõem seu equipamento) ou uma criança (com a câmera baixa e quase sem luz).

 

E esse excesso de alternâncias não acabam por aí, quando em determinado momento o longa aposta em uma virada narrativa, e decide se debruçar sobre as consequências, no presente, dos eventos passados, através dos malefícios de uma cobertura midiática e sensacionalista do caso retratado, deixando de lado os elementos do terror de possessão, colocados em segundo plano, para explorar vinte minutos de uma interessante veia de slasher, bastante repentina.

 

No final, acaba que muitos elementos narrativos, relativos ao próprio universo de Traumatika, acabam subaproveitados – como a própria mitologia do demônio antagonista, sua simbologia em relação ao prólogo (que realmente só parece querer evocar uma referência/homenagem ao clássico de Friedkin, sem muito mais a dizer com isso), as motivações da pessoa que abre a lâmpada, e a própria maneira como a narrativa se resolve nos instantes finais, até um tanto abruptos quando comparado a tudo que fora feito anteriormente com certa paciência. Mas por outro lado, é muito curiosa e envolvente a maneira como o filme de Tsigaridis conseguiu deixar-me incomodado, seja com a violência excessiva, o clima pesado de um demônio que vai além da violência física e psicológica, mas chega também à uma violência sexual, como uma espécie de doença (ainda que isso não seja tão desenvolvido); a maquiagem extremamente caprichada, e até mesmo o ótimo uso de um baixo orçamento, com uma equipe reduzida e de funções acumuladas, mas muito eficaz para a produção desse clima desconfortável e provocativo que busca a todo tempo. Confesso, um dos poucos filmes recentes que conseguiram me deixar com medo.

 

Avaliação: 3.5/5

 

Traumatika (Idem, 2025)

Direção: Pierre Tsigaridis

Roteiro: Pierre Tsigaridis e Maxime Rancon

Gênero: Terror, Thriller

Origem: EUA

Duração: 88 minutos (1h28)

XXI Fantaspoa (Mostra Low Budget, Great Films)

 

Sinopse: Os terrores noturnos de um menino se tornam realidade quando sua mãe começa a mostrar sinais de possessão demoníaca. O que ele está prestes a enfrentar o assombrará pelo resto da vida e ceifará inúmeras vidas ao longo de gerações. (Fonte: Fantaspoa)

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